Retrô Chic – Analisando alguns figurinos da novela Gabriela

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Quando fiquei sabendo do remake da novela Gabriela, já imaginei que ela seria um sucesso. A obra de Jorge Amado na verdade, é muitíssimo rica e cheia de detalhes peculiares que fazem com que o leitor e/ou expectador, se veja plenamente envolvido com a  trama. Na verdade, a novela é uma das homenagens que a Globo reservou para homenagear o centenário do autor. A novela que foi inspirada  em um dos maiores clássicos do escritor: Gabriela Cravo e Canela,  se passa na Bahia dos anos 20, uma época muito peculiar para a cidade de Ilhéus, pois esta vivia sua fase áurea do cacau.

O engraçado, é que a personagem principal é criada e desenvolvida em meio a uma sensualidade brejeira, sem nenhum tipo de auxílio de figurino ou qualquer outro recurso visual. Os longos cabelos castanhos, com sua ondulação natural, com os vestidos quase em trapos e os pés descalços, fazem nascer uma mulher envolvente e que consegue cativar em pequenos detalhes, muitos deles no gestual firme e forte, mas ao mesmo tempo de uma delicadeza ímpar. Mas tanta simplicidade é apenas de Gabriela, pois todos os outros personagens, são construídos com um trabalho primoroso de pesquisa, para se compor um figurino complexo e cheio de elementos impactantes.

O momento histórico da trama

Os anos 20, também são chamados de Anos Loucos, pois nesta época, algumas ousadias começaram a ser possíveis. (Fico imaginando o que eles diriam se pudessem ver como vivemos agora, pois apelidariam nosso momento como anos louquíssimos, mas isso é papo para outro post) O fato é que com o final da primeira guerra mundial, o mundo em geral passava por um momento de celebração à vida e a liberação feminina começou a encontrar o seu lugar. Os espartilhos começaram a ser abolidos e as mulheres começavam a usar um estilo mais livre e mais leve,  com cabelos curtíssimos à la garçonne, conseguem várias adeptas desse novo modo de se vestir e pensar. Os vestidos são tubulares e a cintura é rebaixada, sem marcar os quadris e os seios. São peças fluídas, cheias de detalhes como franjas, laços, fitas e usados com meias calças beges ou brancas e com chapéus delicados e românticos. Como era a época do jazz, do foxtrote e do charleston, tudo o que se via nas telas do cinema, acabava sendo copiado por muitas mocinhas e senhoras da época, mesmo as que eram de famílias mais conservadoras. As artes e a arquitetura também ganham atenção especial, e o auge do cinema mudo divide espaço com o estilo Art Decó, com suas singulares formas retas e geométricas. 

O Charme de Gabriela

Conforme já falamos, Gabriela (Juliana Paes),  é simples e possui uma beleza rústica que se pontua sem o uso de rímel, blush, batom ou sombra. As sobrancelhas mais grossas e a pele curtida do sol, fazem par com os cabelos longos e com ligueiro cacheado, mostrando uma sensualidade simples e cheia de nuances delicadas e ao mesmo tempo fortes e expressivas. A impressão que eu tenho, é que o personagem por si só, é tão forte, que qualquer tipo de figurino é dispensável.

A moderninha da trama

Malvina  (Vanessa Giácomo) é a moderninha da novela. Apesar de ser uma moça de família tradicional de Ilhéus, ela sempre está por dentro de tudo que se passa no mundo. Ela usa os cabelos curtos e com franja, e as roupas, são com cores contrastantes, formando figuras geométricas e criando assim, um efeito visual muito interessante. Ela também aparece com cintinhos finos e delicados, acompanhados com sapatos de boneca. A supervisora de criação da novela, Juliana Mendonça usou como referência Louise Brooks, uma atriz do cinema mudo que viveu à frente do seu tempo e imortalizou o corte de cabelo “a la Garçonne”. Por se tratar de uma jovem, ela terá o rosto rosado e corado, simbolizando saúde. E isso ficará à cargo de um blush com tonalidade rosada, delicadamente aplicado no rosto da atriz. Ela usará batom claro e as unhas serão sem esmalte. Trata-se de uma feminista, de uma mulher que deseja se ver inserida no mercado de trabalho, quer contribuir para o progresso da sociedade e o corte de cabelo curto, remete à praticidade e a modernidade de uma moça visionária.

Cabeças Enfeitadas

Modelo Clochê usado por Angelina Jolie no filme “A Troca”
O Fascinator  voltou com tudo e tem sido sempre visto na cabeça das mulheres da Família Real inglesa
As cabeças estão todas com elementos fortes e cheios de simbolismo.  Os chapéus surgem dando um tom de glamour e classe às mulheres da sociedade. Na década de 20, eles aparecem sendo usado apenas pela manhã e haviam vários modelos cobiçados pelas moças e mulheres da época. Os modelos clochê eram os favoritos, e eram usados de forma bem profunda, quase escondendo os olhos. O interessante é que eles são super democráticos, e aparecem tanto na cabeça das moderninhas, como na cabeça das sinhazinhas mais recatadas da cidade. O fascinator também surge como um acessório poderosíssimo e muito usado principalmente à noite, com forte conotação sensual. As meninas do Bataclã fazem muito uso dele nos seus eventos noturnos.

O estilo do Bataclã

A dona do Bataclã é Maria Machadão (Ivete Sangalo), que como o próprio nome  dá a entender tratar-se de uma mulher forte e decidida que soube como ninguém , pôr de lado o seu coração e suas paixões, para investir no seu futuro. Seu sonho sempre foi poder livrar-se da sua vida de prostituição, e para isso, manteve em prática seus planos de não se apaixonar e poupar seu dinheiro para ter algo seu.  Quando finalmente consegue e abre seu bordel, não pode ser uma mulher frágil e sonhadora, mas tem que tocar a casa por vezes, com rigidez militar.  Para representar tal mulher, foi escolhida Ivete Sangalo (ótima escolha), com sua voz grave e seu jeito firme. A inspiração para a criação da identidade visual da personagem, foi uma mulher que também sempre se manteve em evidência por seu temperamento firme e decidido, aliado ao seu talento inegável – Coco Chanel. Machadão surge também com cabelos curtos com os de Chanel, e com os ombros marcados por ombros e mangas largas, que fazem referência ao poder. Seus brincos, colares, pulseiras e anéis, assim como os adornos de cabelo, são pesados e mostram seu poder financeiro, que lhe permite ter jóias de qualidade, que as distingue, das outras mulheres do local.
O Bataclã é um ponto de encontro de muito destaque na trama, pois em se tratando de uma cidade pequena e sem muitos meios de se divertir, os homens da época encontravam na casa de Maria Machadão, um local perfeito para jogarem, beberem, conversarem e principalmente, caírem nos braços das “meninas da noite”. E seja como for, qualquer livro, filme ou novela que tenham um bordel, terão nele um ponto muito importante na trama. Reparem que muita coisa se desenrola por lá, e personagens de vários núcleos, podem enfim se encontrar, pois neste momento, todos se tornam iguais e frequentam o mesmo local, sem distinção de classe social ou idade. O importante é ter naquele momento, tenham o dinheiro para pagar pelos serviços, seja ele conseguido com sacrifício ou não.  O figurino das personagens é riquíssimo em detalhes e elementos, e misturam estilos vindos de várias partes do mundo, uma vez que coronéis e viajantes estrangeiros de passagem pela cidade, levam presentes caros para as moças do bordel. Elas por sua vez, parecem se redimir ao se entregarem aos cuidados e a vaidade, uma vez que tem que aproveitar as noites para serem as donas da festa, pois durante o dia, não eram bem vistas quando circulavam pela cidade e não eram aceitas pela sociedade.  E todo o fervor noturno da casa, é mostrado com riqueza de detalhes, com dança, música e com um visual impecável das meninas que capricham na maquiagem. Elas surgem com um olho preto esfumado perfeito e com batons vermelhos que sempre vem acompanhados de rímel e  blush. A pele de porcelana era evidenciada pelo pó compacto (naquela época, chamado de pó de arroz) e muitas vezes com pintas falsas, feitas com lápis de olho. As roupas são cheias de detalhes e com cores fortes e expressivas.Os pescoços surgem adornados por colares de todos os tipos e tamanhos, tudo muito maxi, muito over e muito forte. As unhas vermelhas aparecem dando o tom de sensualidade, assim como lingeries ao estilo boudoir, sempre provocativas e muito sensuais. Aliás, pelo que podemos perceber, o figurino do Bataclã é o mais rico e mais interessante da trama, pois une vários elementos sem pudor algum, e sem medo ou receio de ousar demais em alguma coisa. Vale lembrar, que o Bataclã contará com shows e apresentações musicais, sendo assim, seguindo a linha de espetáculos, teremos ainda mais coisas para ver, figurinos cheios de beleza e ousadia, que certamente renderão vários comentários.

A mulher da janela

Existe uma personagem na trama muito interessante. Trata-se de Glória (Suzana Pires), a “teúda e manteúda” do Coronel Coriolano (Ary Fontoura). Ela “vive” a vida através da sua janela, uma vez que não sai de casa. Por ser amante do coronel, não é bem vista pelas outras mulheres da cidade, e por outro lado, também não é uma das meninas do Bataclã. Ficando sem posição definida, ela se vê sozinha em meio à sua condição nada confortável. O visual dela é um tanto quanto diferente das mulheres da época. Seus cabelos são longos e seus vestidos são mais ajustados, com foco nos seios, já que ela vive atrás da janela e pouco pode mostrar do seu corpo.

As unhas da mulherada

Seja no Bataclã ou na janela de casa, as unhas das mulheres da novela seguem um estilo muito peculiar: esmalte vermelho com meia lua. A técnica se popularizou com Dita Von Tesse, a grande Diva do Burlesque, sendo sua marca registrada. E agora essa mesma técnica, que também é conhecida por alguns, como francesinha invertida, uma vez que o trabalho é feito próximo das cutículas, se tornou a marca registrada de algumas mulheres apimentadas da cidade de Ilhéus! Só as mais recatadas e ditas de família, que não embarcam nesse estilo. As outras, mais liberais, não perderam a oportunidade.

Influências que vem do Rio de Janeiro

Existe um casal na trama que também vale ser analisado. Trata-se de Anabela (Bruna Linzmeyer) e Príncipe Sandra (Mateus Solano),ambos artistas e vindos do Rio de Janeiro. Vale lembrar que na época, o Rio de Janeiro era uma referência no que diz respeito às artes de todas as formas e gêneros, e os artistas eram sempre figuras cheias de modernidade e com um estilo ímpar. Anabela é uma moça moderna e que mistura cores fortes, impactantes e inusitadas, que tanto usa seus próprios cabelos com adornos e chapéus cheios de elementos e informações, como várias perucas, coisa que é incomum na cidade de Ilhéus naquela época. Já Príncipe Sandra, usa uma barba pontiaguda e uma bigode, ambos levemente virados para cima, dando um dar de ousadia que combina perfeitamente com o estilo enigmático que ele traz consigo. Seus trajes são super elegantes e existem detalhes significativos no seu figurino, como uma gravata com uma estampa inusitada ou algum elemento diferenciado, contrastando com o resto do visual  escolhido.
Bom, pelo que deu para perceber, a novela Gabriela é um prato cheio para pessoas que assim como eu, gostam de reparar detalhes sutis, principalmente os que são ligados à moda, nos filmes e novelas de época.
Beijos

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Nota importante:  As imagens são da internet, mas o texto e as análises feitas acima, não foram retiradas do site da Rede Globo, ou qualquer outro site especializado em TV. São propriedade do Tempo Fashion e sua reprodução é permitida, desde que seja citada a fonte.

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